28.10.09

vício de ti


vicio-me em ti
como droga leve que fumo devagar
inspiro o ar que tu libertas
e deixo o teu cheiro a pairar
na alma que tenho aqui
hoje, dentro do peito
alindada a preceito
ressuscitada por te imaginar

bebo-te em tragos
de vinho adocicado, novo
com saudades fermentando o paladar
lembranças do tempo em que te provo
pecado de gula que renovo
antecipando agora o teu chegar

presenteio-me com beijos imaginados
de luz, água, terra, vento e mar
beijos de matéria que me abraça
sentida em presença arrepiante
que me toca mesmo sem tocar.
beijos sufocados por desejo
raro, belo, doce, meigo, forte
que fechando os olhos vejo
escorrendo em palavras no olhar


24.10.09

cofre de dilemas


hoje destroço-me em saudades
morro, aos bocados, diluindo-me em lembranças
não sei se são falsas verdades
simplesmente mudanças
de sol, de lua, de poemas
que em metamorfoses de esperanças
jazem em cofre de dilemas

hoje estou sozinho, em vazios de tempo e espaço
sou actor de filme mudo
onde aparece um miúdo
clamando sofregamente por beijo
que desejo
dado por ti, em abraço.
hoje, sou lábios desenhados em tela fria
lágrima quente em poesia
despida de ousadia
limpando o meu cansaço

espero por silêncios que falem
que me acordem, que me tragam emoção
que me toquem, me arrepiem
me tirem da letargia
inundem alma vazia
com mares cheios de paixão

22.10.09

cor-de-laranja


depois dum curto delirar
liberto aqui, neste poema
a cor da lua apaixonada
fundamentada em teorema
de três palavras e um dilema
que escrevo neste versejar

a cor que pinto como charada
e com palavras em desatino
deixa perfume de citrino
uma acidez mal acordada
deixa um perfil bem feminino
beijando o mar na madrugada

tonalidade descascada
por faca doce de luar
traz a fragrância que se arranja
em matiz nova, cor-de-laranja
nascida aqui para te dar

17.10.09

amarelo

foto: Artur Ferreira (www.olhares.com)

eu durmo em lençóis de girassóis
amarelos com sorrisos rotativos
as pétalas mantendo-se brilhantes
entontecem as almas dos passantes
que lançam seus olhares mais afectivos.
aqueles amarelos ondulantes
que drogam em brisa meus sentidos
quando chegas, ficam loucos e perdidos
surpresos sob airosos céus azuis
repudiam o antigo movimento
passam a girar, mesmo sem vento
em volta do sol que tu possuis

12.10.09

de costas voltadas para o céu

foto: Pereira Lopes (www.olhares.com)

passeio entre pontes da cidade
plantadas em margens que não vejo
pronuncio o meu último bocejo
enquanto conto arcos do passado.
no mergulho do destino desenhado
engulo água fria que estremece
com queda desejada que acontece.
com salto depressivo e planeado

no estrondo do meu corpo em colisão
adormeço em repouso bem profundo
tomo forma de casco moribundo
ruído por milhas navegadas
em correntes escuras, revoltadas
de noites submersas em solidão

o barco de carne inventado
transporta um sorriso acabado
estampado numa vela que é fantasma
veleja sem vento norteado
o destino foi já sorteado
e desenha à superfície um quiasma

de costas voltadas para o céu
quero em mim o abandono dedicado
daqueles que comandam o sentido
da corrente do rio poluído
por ódios que foram despejando.
vejo-me morto, assim, flutuando
nos dejectos dos sentimentos expelidos
por deuses que foram instruídos
em infernos por onde vão passando

9.10.09

vermelho

foto: Ana (www.olhares.com)

vermelho é fogo aceso
mesmo junto ao coração
por um amor madrugada
numa espera cansada
transbordando sedução.
luz do sol ao apagar-se
no mar de lamentação
ondas coral, agitadas
espumas desesperadas
buscando a tua razão.
gotas de sangue espalhado
por ferida sem sarar
cicatrizante esperado
em tempo quase esgotado
no beijo que tens p’ra me dar

7.10.09

cinzento

foto: Bruno Miguel Azevedo (http://www.olhares.com/)

cinzentos são os meus sonhos
distantes do verbo amar
são recortes (des)organizados
em alma por se encontrar
as cinzas dos pensamentos
acumulados em tempos
perdidos e por contar
enfileiram na parada
da memória acinzentada
traída por vão sonhar.
aguardam sono agitado
no corpo mal descansado
sem cama onde agarrar
e em posição militar
esperam sinal velado
da ordem pr’atormentar

2.10.09

verde

foto: Maria Isabel Batista (www.olhares.com)

verde
cor gritante em terra firme
acabada de lavrar
primavera mal pintada
no inverno por chegar
gotas de orvalho, lágrimas
sinais de estacão perdida
o outono, em despedida
sem tempo para ficar.
choro de cor, sentido
borrão de pincel caído
em tela por acabar

azul

foto: Sérgio Velho Júnior (www.olhares.com)

azul
pedaço de céu não nublado
recortado sem chover
esperança não perdida de te ter
quando o azul escurece devagar.
pintado o anoitecer,
perde luz, sem se importar
sem esperar cheia lua
(como a tua)
que nos meus olhos pousada
fica sorrindo parada
mantém-se acordada, a brilhar…