22.2.13

linha

Há uma linha que separa
o sobreviver do viver:
TU.
e assim sobrevivo
até que alinha nos abrace
ou
se parta em fragmentos de alma
que se lançam freneticamente
na corrente do tempo
flutuando como lembranças
do passado onde sobrevivemos juntos.

poema inacabado, ou não (XXXII)

Talvez um copo de vinho
de uma garrafa
há muito por acabar
traga o sorriso
ou o veneno
da liberdade.

Embebedo-me hoje?

poema inacabado, ou não (XXXI)

tudo isto
num comboio
que marcha impavidamente
em duas linhas
incólumes à neve que cai,
indiferentes à minha paralela solidão

poema inacabado, ou não (XXX)

a impotência das coisas
vai-me aconchegando o corpo
deixando-me a respirar
por uma fresta que
sarcasticamente
me disponibiliza CO2
para vegetar

poema inacabado, ou não (XXIX)

e o sol
senhor do Mundo
mudou-se de galáxia
impondo as trevas
no planeta que há muito
deixou de ser azul
e eu feliz

poema inacabado, ou não (XXVIII)

depois, temos o mar
onde mergulhamos
sem saber nadar
esperando que guelras
nos cresçam de repente
e o milagre da sobrevivência
aconteça

panfleto


Era uma vez um panfleto
revolucionário
que perdeu o texto
numa manifestação de rua.
Ficou despido de apelos
perdeu a voz das palavras
imprimidas a “times new roman”
“bold”, tamanho 12
e em branco, enrugava-se
sob os pés de manifestantes alheios
à sua condição.
Um menino, encontrou-o.
Fez um avião
que aterrou no parapeito de uma janela
onde um poeta
escrevia versos de amor.

Convertido, o panfleto tem agora
um poema escrito, à mão

17.2.13

uma morte curta

Hoje morri pela primeira vez.
Uma morte curta
contei segundos
fui relógio à procura do fim do tempo
e ajoelhei-me
vergado por uma chicotada
que se enrolou na cabeça
e deixou os olhos confusos
vendo os telhados no chão
as portas com entradas para o céu
e as janelas, todas circulares
em rodopios encaixilhados.

Uns segundos onde o mundo
coube todo no meu peito,
uns segundos
onde as despedidas correram
as faces todas da vida.

Redemoinhando como um louco
hoje morri pela primeira vez
uma morte curta
contei segundos
e pedi para te poder ver
só mais uma vez.

irrealidade

Esperava que a porta se abrisse
e ela entrasse
e se deitasse
sem dizer absolutamente nada.
Sozinho
construía lendas
desenhava histórias
como esta
e pela fresta da irrealidade
onde vivia, espreitava
e a verdade
voltava
deixando a cama, como sempre
vazia.

a sobremesa

Sem ti, como as palavras
que escreveste
e adoço o chá de camomila
com bocados de mel
de um poema
que encontrei dentro do bolo
deixado por ti para sobremesa
com um lápis a enfeitar.

Adormeci, depois
vendo os teus olhos
nos meus
fechados
a dizer-me boa noite
apenas com um simples brilhar.

poema inacabado, ou não (XXVII)

e o caracol ultrapassou o avião
que parado
em terra
por causa da greve geral
deixou de voar

assim fica o homem
parado
em terra
quando a greve é de sonhar

pousar em ti devagar

depois voo
com as palavras que me penduraste nas asas
que espero que se digam

devagar, perdendo lastro
quero pousar em ti...

quero-te louca

quero-te louca
como se abrindo os braços
tocasses o céu e a terra
como se o teu corpo fosse enorme
e forte, e aceso
acolhendo todas as vontades
que tenho de ti

hoje não venhas
que te mato com meus beijos

só histórias


A solidão mata-se com 3 “lorenin”
de uma assentada
e tu logo apareces
deitada a meu lado
contando as histórias
que eu inventei para tu dizeres.
São só histórias
de hipotéticos livros que contam coisas
que queria fazer acontecer

A solidão é a luz que me apaga
que me entristece
e me anda a entreter
a vontade de viver…