27.8.09

conversas mudas

foto: Nelson Rafael (http://www.olhares.com/)


o silêncio era rei naquele espaço
onde sons estridentes violavam
conversas mudas em compasso
de bocas que há muito recusavam
o caminho fácil e devasso

gestos de mãos doces esboçavam
poemas de palavras desenhadas
impressionistas telas bem pintadas
com movimentos flutuantes de amor

os dedos em linhas bem traçadas
riscavam para nós simples mortais
palavras transparentes bem talhadas
mostrando que as falas desvairadas
de gentes pequeninas e banais
não passam de notas mal tocadas
que usadas em registo delator
ensurdecem almas massacradas
provocando como espadas, tanta dor

26.8.09

uma mão

foto: Paulo Paulos (http://www.olhares.com/)

ruídos sincopados de carris
embalam docemente os sentidos
que descansam em olhares adormecidos
nas memórias acenadas duma mão.
olhando a janela distraída
do lugar sorteado onde me sento
avisto a imagem distorcida
sem face, sem corpo e num momento
reconheço tua mão embevecida
sorrindo para mim, dando-me alento.
ouço no entanto, já bem distante
um grito uniforme de agonia
que ecoa no cais e que atraía
agora um mar de solidão.
os azulejos choram, em sintonia
acabando com toda a policromia
que à partida alindava a estação.
ruídos sincopados de carris
turvaram de cinzento o coração
deixando marcado um acenar
longínquo e sentido duma mão.

15.8.09

sorriso de guitarra


teu sorriso tem desenho de guitarra
que gostava novamente de tocar
com meus lábios que sentem docemente
os teus, nesse terno musicar.
tuas mãos beijam leve, com carinho
as cordas que se agitam a sonhar
doze linhas de horizonte feitas linho
que se cosem com sentido no olhar.
vi teu colo abraçar com sentimento
o corpo da guitarra que agradece
esse jeito que é só teu e que eu invento
poder ser meu por um momento
deixar-me novamente com um cento
de beijos cor de mel para te dar.

13.8.09

por aqui, não tenho mar

foto: Paulo Gradim (www.olhares.com)

por aqui, não tenho mar
invento-o para sonhar
quando o quero ter por cá.
entre uma brisa amena
do teu azul ondular
imagino o teu olhar
colho a tua maresia
fico com uma mão cheia
de eterna poesia
feita de conchas e areia.
no meio, quase sem querer
encontro a pedra roliça
que gosto sempre de ter
e que recebi de ti
no dia em que te vi.

é meu rubi verdadeiro
quando feito marinheiro
o uso como argumento
fazendo dele intrumento
para convencer a terra
a deixar-me navegar
embora não tendo mar...

abraço-a na minha mão
vou em terna expedição
de olhos bem acordados.
vejo ilhas solidão
estrelas de ilusão
águas revoltas, espuma
encalho em aluvião
quando a tua face em bruma
me lembra quase a chorar
que não posso navegar
porque aqui, não tenho mar…