15.3.10

pedaço de ti

foto: Marcos Oliveira (www.olhares.com)


pedaço de ti
que encontro quando chove
e que em arco-íris
em mim se morre
com prazer
apagando feliz
o escuro do meu ser.
assim, para te ter
choro chuva cor de giz
branca, sem significado
e espero fascinado
pelo brilho que acontece.
colho a cor que me apetece
pinto a alma a preceito
depois, quando entardece
beijo-te de luz, com meu jeito
e as sete cores adormeço
descansadas, no teu peito

13.3.10

passo a passo

foto: Raquel Madureira (www.olhares.com)


passo por ti
com passo largo
traço a compasso
circunferência
com transparência
que quase afasto
gosto que tenho
de passo a passo
seguir o traço
e embaraço
perder espaço
perto de ti

mas com um laço
dou-te uma flor
que cheira à cor
e mostra a dor
deste meu passo
desembaraço
de andador
atrás de ti

11.3.10

enxurrada


adoro quando me olhas
com palavras adoçadas
leio nos teus olhos textos
antigos e segredados
dos futuros apagados
por águas correntes, salgadas
levando em enxurradas
que desaguam no (a)mar
desejos que são viajantes
desejos de me falar

adoro quando sorris
com os dedos em enredos
roçando as gargalhadas
desenhando momices dançadas
em palavras disfarçadas
mudas, sem letras, cansadas
engolindo os meus medos

a tua pele me cativa
com lampejos de arrepio
enchendo este vazio
onde imensa comitiva
de fantasmas em degredo
matam-se quase em segredo
e deixam viver a vida

8.3.10

parto de partida


parto dum cais
sem a partida
bem definida
por marinheiro
sou o primeiro
que sobranceiro
assisto ao parto
da criatura
(contra-natura)
e mal parida

no temporal
sem um sinal
que avisasse
esta partida
chegam chacais
devoram vida
que sem saída
geme doída
perde a partida
morre no cais

6.3.10


lá, onde os sonhos moram
vamo-nos afundar devagar
vamos perder os sentidos
engolindo todo o mar
que em marés de paixão
vai cumprindo a função
de nos embalar a salgar

as entranhas, as vontades, os desejos
em lábios cheios de beijos
mas sem força pr’a sorrir
nem que seja por sentir
a aragem dum amor
que nos deixa seu odor
perfumado, ao fugir

lá, onde os sonhos moram
vamos contar as estrelas
de céus com poucas janelas
por onde podemos olhar
com olhos a marejar
as utopias da vida, que nos parecem tão belas.
lá, caem palavras de água
que afogam a minha mágoa
deixando na minha pele
gotículas do teu sabor
estas, percorrem as linhas
que se desenham sozinhas
pelas passagens da dor

4.3.10

partidas e chegadas


as angústias das partidas
entrelaçam-se em anseios de chegadas
baralham-se em horas marcadas
ou desmarcadas
por atrasos repentinos
perdem noção, ganham miragens.
as origens não sabem se são destinos
imploram aos seres divinos
e deixam morrer as viagens

à espera, tu, em cada ponta da linha
ponte aérea aguardada
de voos em fios de lã
esperando um amanhã
de partida sem chegada

à espera, tu, abraçada
a uma chegada agendada
tricotada em solidão
tu sem tempo, estás parada
numa vontade de nada
perdida na madrugada
com tempo para a ilusão